Split payment: como funciona e o que muda com a reforma tributária

Se o “float” do tributo ainda ajuda seu caixa, prepare-se: o split payment puxa a saída de IBS/CBS para o instante da venda, trocando folga por previsibilidade. O cronograma oficial põe testes em 2026 e início gradativo em 2027.

Se você lidera tesouraria, fiscal ou controladoria, já sentiu como a complexidade tributária corrói tempo e caixa. No Brasil, as empresas gastam entre 1.483 e 1.501 horas por ano para preparar, declarar e pagar tributos. Um recorde mundial.

Nesse cenário, a nova reforma tributária acoplou o split payment à liquidação financeira buscando tanto otimizar, quanto aumentar a segurança do processo de arrecadação de tributos.

Assim, além de o processo ficar mais ágil, também haverá redução de fraudes, como as notas frias, e da inadimplência.

Na prática, as mudanças previstas pela reforma tributária impactam integrações, cobranças e prazos de recebíveis.

Para te ajudar a preparar sua empresa para este novo cenário, nós criamos este artigo te explicando tudo o que você precisa fazer para ficar em conformidade com o Fisco! Confira!

O que é split payment?

Split payment é o mecanismo que, no momento da liquidação de uma venda, divide o valor pago em duas destinações diferentes: a sua empresa e o Fisco.

Com esse novo mecanismo do split payment, o imposto deixa de transitar pelo caixa da empresa e passa a ser quitado (ou caucionado) pelo arranjo de pagamento, tomando por base os dados da NF-e ou NFS-e.

Na prática, o split payment pode operar em níveis de sofisticação. O desenho brasileiro contempla desde o “split simples”, que separa o valor nominal do imposto, até o “split superinteligente”, que considera, em tempo real, débitos e créditos do adquirente para reter apenas o valor líquido devido.

Essa arquitetura, além de permitir que os créditos tributários sejam compensados de forma mais ágil, também aumenta a previsibilidade e reduz a necessidade de ressarcimento.

É importante destacar que o split payment não cria novos tributos, apenas automatiza a arrecadação dos que já existem no desenho da reforma, atacando problemas crônicos como as notas frias, o crédito indevido e a dependência do recolhimento via DARF/guia.

Qual a diferença entre split payment e retenção na fonte?

O split payment atua na liquidação financeira e é coordenado pela infraestrutura de pagamentos e pelos sistemas fiscais. Já, a retenção na fonte atua na fase de faturamento, te obrigando a reter e recolher o tributo do prestador.

Ou seja:

  • Na retenção, a liquidação financeira te paga o valor integral da nota e cabe a você calcular, reter e recolher o tributo em guia própria;
  • No split payment, a segregação ocorre dentro da liquidação: a instituição de pagamento/adquirente divide o valor pago conforme os dados da NF-e, e direciona automaticamente a parcela do IBS/CBS ao ente competente.

Outra diferença essencial é a granularidade transacional:

  • Em retenções clássicas, você trata lotes e apurações periódicas, acumulando responsabilidades e riscos de classificação, base e alíquota.
  • No split payment, cada transação carrega metadados do tributo e se liquida com segregação instantânea, reduzindo risco operacional e de “caixa com tributo”.

Mas, fique atento: em setores com regra de retenção, o split payment e a retenção podem coexistir durante a transição, exigindo parametrização cuidadosa no ERP para evitar bitributação ou glosas.

Split payment é uma obrigação fiscal ou uma prática comercial?

O split payment é, antes de tudo, uma obrigação fiscal operacional do novo modelo de arrecadação. Quando a operação estiver no escopo regulatório, o split payment deixará de ser uma escolha comercial e passará a ser a forma padronizada de quitar o imposto, integrada ao sistema de pagamentos.

Na prática, isso significa que quando sua operação estiver no escopo do split payment, o split payment será mandatário. Até lá, você deverá observar as regras de implantação definidas pelo Ministério da Fazenda, seguindo os cronogramas de testes e fases.

Fora isso, é recomendável adotar modelos internos de split payment para governança e testes controlados. Essa distinção protege pricing, contratos e evita alarmes desnecessários com clientes internos.

E sempre documente as exceções operacionais no manual fiscal.

Split payment elimina a responsabilidade do contribuinte pelo recolhimento?

O split payment não elimina a responsabilidade do contribuinte pelo recolhimento do tributo. Ele apenas redistribui e automatiza. Na prática, sua área fiscal migra parte do esforço de apurar e cobrar para prevenir e parametrizar.

Isso porque o split payment redefine quem faz o que no momento do pagamento, mas não elimina deveres instrumentais, nem a responsabilidade sobre dados corretos na nota e na ordem de pagamento.

Ou seja, a empresa continua responsável pela emissão correta da nota fiscal, pela classificação de receitas, pela integridade dos dados enviados e pela conciliação entre vendas, liquidações e apuração.

Se a base de cálculo, a alíquota ou o CFOP estiverem errados, a segregação automática do split payment propagará o erro e a responsabilização seguirá a legislação com aplicação de multas, glosas e/ou complementos.

Assim, o que muda de verdade é o ponto de controle. Portanto, no curto prazo, você precisa elevar a maturidade de dados fiscais, integrações e governança.

Inclusive, é muito importante que você considere todos os processos financeiros, desde a gestão de despesas de funcionários, até o controle do caixa. Afinal, as mudanças previstas pela reforma tributária têm efeito amplo.

Leia também: Nova reforma tributária: o que muda na gestão de despesas?

Como funciona o split payment no contexto da reforma tributária?

O funcionamento combina três pilares: documento fiscal eletrônico, meio de pagamento habilitado e regras de segregação vinculadas a CBS/IBS. Como explicamos anteriormente, o split payment funciona acoplado à liquidação do pagamento.

Quando você paga, o arranjo de pagamentos lê os dados fiscais da NF-e ou NFS-e, calcula a parcela do IBS/CBS conforme as regras vigentes e segrega o valor em dois destinos:

  • O líquido, que vai para o fornecedor;
  • A parcela tributária, que vai para as contas indicadas pelos entes competentes ou órgãos gestores.

Esse fluxo acontece em tempo real e gera comprovantes que você consegue conciliar por transação. De forma mais detalhada, o processo acontece em 6 passos principais:

  1. Emissão fiscal — A operação nasce no XML (NF-e/NFS-e) com base de cálculo, alíquotas e identificadores (chave de acesso);
  2. Iniciação do pagamento — Você autoriza a cobrança no PSP/adquirente;
  3. Validação do documento — O orquestrador de split consulta e valida o documento fiscal e as regras aplicáveis (CFOP/NCM/regime), para evitar segregar valores com base em dados incorretos;
  4. Cálculo e segregação — O motor calcula a parcela do IBS/CBS e executa a divisão;
  5. Liquidação e recibos — A transação retorna com IDs (NSU/trace/ARN, hash do XML, carimbo de data e hora) que você usa na conciliação contábil e fiscal;
  6. Pós-liquidação — Estornos, devoluções e chargebacks disparam eventos reversos (ou compensatórios), sempre referenciando a transação original para manter o rastro.

O objetivo principal dessa mudança é tirar o imposto do “meio do caminho” do caixa e ancorar o recolhimento no próprio ato de pagar, preservando trilhas de auditoria.

O que muda para você, na prática, é que o pagamento vira também um evento fiscal, não só financeiro. Além disso, a conciliação passa a ser por transação e o risco de crédito “podre” cai, mas a dependência de parametrização correta aumenta.

Um ponto sensível desde já é a aderência do ERP e dos PSPs à referência única entre documento fiscal e transação: sem essa “âncora”, conciliações e ressarcimentos perdem velocidade.

Como o split payment afeta o fluxo de caixa das empresas?

O efeito-chave é antecipar a saída do imposto para a hora da venda, reduzindo o “float” tributário que hoje fica temporariamente no caixa.

Para quem contava com essa folga para capital de giro, o split payment pressionará a liquidez, especialmente em negócios de margem apertada, altas parcelas e prazos longos de recebíveis.

Por outro lado, traz previsibilidade e reduz desembolsos imprevistos por glosas ou autos de infração.

Será necessário que você fique atento a alguns cenários mais críticos, como:

  • Pagamento parcial e parcelado: você pode ter segregação proporcional por parcela ou na primeira parcela, a depender das regras e do arranjo. Defina isso contratualmente com o PSP/adquirente e modele no ERP para não “estourar” receita/tributo em um único evento;
  • Marketplaces e subadquirência: o split entre múltiplos recebedores (seller, comissões, logística) convive com o split tributário. A chave é encadear IDs: pedido → NF-e → subadquirente → adquirente → PSP → recibos;
  • Adiantamento de recebíveis: quando você antecipa, verifique se a segregação tributária já ocorreu. Caso não, a antecipação não pode “comer” a parcela do IBS/CBS;
  • Devoluções/estornos: padronize o “evento reverso” com a mesma chave fiscal/financeira. Sem isso, a reconciliação fica frágil e você perde rastreabilidade.

Além disso, existem três frentes principais que você precisará modelar no DRE e no fluxo de caixa:

  1. Timing de caixa: simule a ausência do “colchão” entre D+0 e D+30;
  2. Crédito mais rápido: a promessa do IVA é acelerar o aproveitamento/ressarcimento de créditos, o que compensa parte do efeito no giro;
  3. Custo de conformidade: menos horas de guias, mais esforço up-front em dados e integrações.

Por fim, uma dica é criar uma métrica de sensibilidade do caixa ao split payment por canal (cartão, boleto, Pix) e simular cenários com o split payment em D0 e D+1. E não esqueça de projetar split payment em promoções com desconto.

Como fazer conciliação contábil com split payment ativo?

A chave é ancorar tudo no número do documento fiscal e nos IDs de liquidação. Com split payment ativo, a conciliação deixa de olhar apenas “venda vs. extrato” e passa a considerar três camadas:

  1. Documento fiscal autorizado;
  2. Evento de liquidação referenciado à nota;
  3. Eventos de segregação/estorno do tributo.

Inclua reconciliação diária para diferenças de D+0/D+1 e um “aging” específico para pendências tributárias.

Contabilmente, o recomendado é criar contas transitórias para CBS e IBS segregados e parametrizações de débito automático e reversões. O segredo é começar de forma simples, desenhando um plano de contas com contas-espelho para IBS a recolher (split) e CBS a recolher (split), separadas das rubricas tradicionais.

No D0, o recebimento líquido deve cair na conta Clientes com contrapartida na conta Receita e, simultaneamente, o valor de IBS e CBS deve ser baixado via contrapartida em Tributos sobre Vendas (Split), da seguinte forma:

D - Clientes (R$ 1.000,00)

C - Receita Bruta (R$ 1.000,00)

Na liquidação (D0):

D - Caixa/PSP (R$ 850,00)

D - IBS a recolher (split) (R$ 90,00)

D - CBS a recolher (split) (R$ 60,00)

C - Clientes (R$ 1.000,00)

Essa arquitetura permite rastrear a liquidação por meio de extratos dos PSPs/adquirentes e relatórios do comitê/Receita.

Além desses controles, outras boas práticas para você seguir na gestão do split payment são:

  • Nos fechamentos, monitore KPIs como “% de vendas com split vinculado à NF-e”, “tempo médio de compensação” e “volume de exceções tratadas”;
  • Para equipes distribuídas, crie um playbook de exceções;
  • Na auditoria, documente testes de conciliação e guarde logs por prazo superior ao decadencial;
  • Se você opera marketplace, segregue “splits comerciais” (comissões) do split payment tributário.

Empresas precisam adaptar seus ERPs para suportar split payment?

O split payment exige capacidades que nem todo ERP tem por padrão. Por isso, quanto antes você fizer o gap assessment, melhor.

Para gerir o split payment corretamente, seu ERP precisará de capacidades específicas, como:

  • Referenciar a NF-e na ordem de pagamento;
  • Leitura e validação granular do XML da NF-e/NFS-e;
  • Tratar contas transitórias de CBS e IBS;
  • Gerar trilhas de auditoria;
  • Contabilização automática do par “líquido ao fornecedor” + “tributos ao fisco”;
  • Integração com adquirentes/PSPs para receber o arquivo de segregação por transação;
  • Suportar regras de estorno, devolução e compensação com granularidade por documento e por transação, a fim de realizar a gestão de exceções.

No geral, o desenho do processo precisará ser liderado por evento (event-driven). Ou seja, cada venda deve gerar um evento fiscal e um evento financeiro, ambos reconciliáveis.

Se você usa marketplace ou subadquirente, teste o encadeamento completo (vendedor → subadquirente → adquirente → PSP) com o split payment ativo para não perder o vínculo entre a nota e a liquidação.

Mas, para que os processos funcionem corretamente no novo cenário da reforma tributária, as mudanças precisam ir além do ERP. Todas as ferramentas usadas na gestão financeira precisarão estar integradas para que os processos ocorram de forma automatizada.

É o caso, por exemplo, dos processos de prestação de contas de funcionários. Sem um sistema de gestão de despesas adequado, você pode deixar de ganhar créditos fiscais e, até mesmo, ser autuado pelo Fisco por inconsistência tributária.

Confira nosso artigo “Nova reforma tributária: o que muda na gestão de despesas?” para entender mais sobre o assunto!

Sem upgrades, o split payment vira gargalo, mas com upgrades, ele vira alavanca de eficiência e redução de litígios.

Agora que você já sabe mais sobre como o split payment funcionará, entenda sobre outro aspecto importante da reforma tributária no nosso artigo: Crédito fiscal: como gerar e recuperar de despesas de funcionários?

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